domingo, 14 de setembro de 2008

O ESTRESSE NO TRÂNSITO

O aumento acentuado da frota automobilística nos últimos anos está saturando nossas ruas, avenidas, provocando enormes congestionamentos, tornando o tempo médio de deslocamento entre um ponto e outro de uma grande cidade cada vez maior, principalmente nos horários de pico, que são no início da manhã e final da tarde.


Segundo as estatísticas realizadas pelo DETRAN / PR ( 2006 ) a frota de veículos só na cidade de Curitiba aumentou 6,21% de 2005 para 2006 e estima-se que neste ano ela chegue a um milhão de veículos, concluindo que para cada dois habitantes um possui veículos.

Com o aumento da frota, causando congestionamentos, maior poluição sonora provocada por motores e buzinas, motoristas imprudentes e pedestres que não respeitam as regras de circulação, espera-se também o aumento de estresse e conseqüentemente o aumento dos índices de acidentes, provocados principalmente por falha humana, fazendo com que o comportamento agressivo de um motorista desencadeie a agressividade do outro, resultando num quadro caótico de motoristas mal-humorados, agredindo-se mutuamente , aumentando mais a violência urbana.

HENNESSY E WIESENTHAL ( 1997, citado por Presa, 2002 ), tem realizado estudos sobre o estresse, mensurando a predisposição ao mesmo e as reações dos motoristas ao passar pela experiência de condições de congestionamento no trânsito e encontraram uma grande variedade de comportamentos direto e indiretos provenientes dos motoristas em situações de grande congestionamentos, enfrentando também comportamento provocativo de outros motoristas ou pedestres, xingamentos, palavrões, ofensas morais, etc. Concluem que o estresse ao volante está se tornando uma síndrome típica em motoristas de grandes centros urbanos que usam o automóvel diariamente.


Para VASCONCELOS ( 1998 ), o trânsito é uma disputa pelo espaço físico , que reflete uma disputa pelo tempo e pelo acesso ao equipamentos urbanos – é uma negociação permanente do espaço, coletivo e conflituoso. E essa negociação, dadas as características de nossa sociedade, não se dá entre pessoas iguais: a disputa pelo espaço tem uma base ideológica e política; dependendo de como as pessoas se vêem na sociedade e de seu acesso real ao poder.

Nessa disputa pelos espaços surgem divergências de idéias, de valores, de cultura. E a negociação que deve ocorrer no trânsito nem sempre acontece. Os condutores ficam então, nervosos, ansiosos e estressados, traçando um caminho para a luta e a agressividade no trânsito.

De acordo com STORR ( 1970 ), não pode haver dúvida de que o homem também é um animal territorial. Mesmo em circunstâncias tão remotas do primitivo como na civilização ocidental contemporânea, a área rural é demarcada por cercas e tapume de varas ou ripas, muitas das quais exibem avisos dizendo que os “Invasores serão processados”; e o ingresso em nossas casas de pessoas não-autorizadas é tão ressentido quanto a perda de qualquer propriedade que elas possam esconder. A presença de um estranho no jardim geralmente é considerada como uma ameaça ou, pelo menos, como uma circunstância que exige investigação.

Como os outros animais, o homem também reage com maldade à superaglomeração. Embora, na civilização adiantada, o amontoamento de gente nas cidades não leve, forçosamente, à escassez de alimento, talvez existam traços de agressividade que outrora serviam para espaçar tanto os indivíduos como grupos de homens. Aqueles dentre nós que vivem em cidades aprendem a se acomodar, em certo grau, ao tipo de congestionamento que parece ser uma conseqüência inevitável da urbanização; as quanto mais amontoados ficamos, maior a facilidade com que tendemos ao ressentimento mútuo, favorecendo ao descontrole do impulso agressivo.

É verdade também que algumas pessoas se alteram com maior facilidade quando estão na direção de um veículo, muitas vezes elas nem estão totalmente conscientes dos fatores que estão gerando o seu estresse. Também é importante destacar que nem todo o tipo de estresse tem de ser necessariamente negativo para a condução, já que este pode ajudar, em alguns momentos, no estado de alerta e reação que se necessita para o manejo dos veículos ou para evitar um acidente. O estresse não é mais que uma resposta adaptativa do organismo a situações em que seja necessária uma tomada de decisão. Geralmente esta decisão envolve respostas vigorosas, rápidas e que tem por finalidade o retorno ao equilíbrio.

O cortisol é o hormônio do estresse e seus níveis aumentam e diminuem ao longo do dia, apresentando um pico pela manhã. Este hormônio tem um papel preponderante na regulação do metabolismo, da pressão arterial, da função cardiovascular e da atividade imunológica. O cortisol ajuda o organismo a responder ao estresse, mobilizando-o para uma atividade intensa. Quando produzido em níveis excessivos, em conseqüência do estresse crônico, sobrecarrega o sistema cardiovascular, o cérebro, o metabolismo e as demais funções corporais.

O motorista deve ficar alerta para o estresse crônico, o estresse de longo prazo ( os negativos; conseqüência de situações consideradas altamente estressantes, como por exemplo : a morte de um ser querido, mudança de emprego, divórcio, etc. ). Estes são geralmente geradores de maiores níveis de hostilidade e de comportamentos competitivos, manifestações de agressividade direta em relação a outros condutores aumentando a predisposição para uma condução imprudente , com tendência à tomada de decisões mais perigosas do que a habitual ou com menor valoração e percepção de risco.

Segundo os especialistas em Medicina de Tráfego ( ABRAMET 2002 ), o organismo tende a reagir ao estresse através de quatro estágios : alerta, resistência, exaustão e falência, causando sérias conseqüências físicas e emocionais. O organismo pode diante de uma situação estressante reagir “enviando mensagens” , de tensão muscular nos braços e cintura escapular, sensação de aperto no estômago, taquicardia, rubor facial, insônia, cefaléia, lombalgia, etc.
Assim ,caracterizando a fase de exaustão, e como não é possível modificar o trânsito, temos que aprender a conviver com situações estressantes durante a nossa vida, então, os especialistas em Medicina de Tráfego passam algumas recomendações para diminuir o estresse no trânsito :

- Saia com antecedência de casa;
- Procure caminhos alternativos, evitando grandes avenidas, de trânsito intenso;
- Quando tiver discussão, no trabalho ou em casa, evite sair de casa;
- Procure ouvir música calma e relaxante, em volume condizente, confortável, não ouça o noticiário do rádio. Começar o dia bombardeado por notícias deprimentes sobre corrupção e desvios de verbas é meio caminho andado para piorar seu estado de espírito.
- Deixe o ar condicionado ligado, mesmo com a janela um pouco aberta;
- Conte até dez antes de responder a insultos e fazer gestos obscenos, não descarregue sua ira nos outros. Procure ser mais tolerante com as barbeiragens dos outros motoristas, evite revidar, fechadas, xingar , respeite os pedestres, eles estão desprotegidos em relação a você.
- Faça exercício respiratórios, inspirando e expirando lentamente, “sinta o ar entrar e seus pulmões”;
- Aproveite o trânsito parado para planejar seu fim de semana ou férias;
- Evite manter o pé fixo na embreagem e faça exercícios com os pés.

Procure ser solidário no trânsito.

Cassemira de F. da Maia Kopycki
Psicóloga Perita em Trânsito




REFERÊNCIAS

ABRAMET – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego. Medicina de tráfego : 101 perguntas e resposta. 1.ed. São Paulo, 2002.

PRESA, Luís Alberto Passos. Mensuração da raiva em motoristas: STAXI, São Paulo: Vetor, 2002.

STORR, Anthony. A agressão humana. Tradução de Edmond Jorge. Zahar editores, Rio de Janeiro, 1970.

VASCONCELOS, E. O que é trânsito? 3.ed. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1998.

SAÚDE MENTAL E TRÂNSITO

Pesquisas realizadas afirmam que os transtornos mentais causam pouco mais de 1% das mortes e são responsáveis por mais de 12% das incapacitações por doenças em geral e este número cresce para 25% em paises desenvolvidos. As pesquisas revelam também , que das 10 principais causas das incapacitações 5 são transtornos psiquiátricos, sendo a depressão responsável por 13%, o alcoolismo por 7,1 %, o transtorno obsessivo – compulsivo por 2,8 % , a esquizofrenia 4% e o transtorno bipolar por 3,3% ( LOUREIRO, 2000 ).

Um indivíduo com transtorno mental geralmente apresenta alterações nas suas habilidades, que podem interferir no ato de dirigir, aumentando a sua probabilidade em se envolver em acidentes de trânsito.

Segundo PAIM ( 1986 ) a atenção dos indivíduos é uma das habilidades que experimenta alterações em todos os transtornos mentais. Nos estados hipomaníacos o sujeito consegue manter sua atenção em cada objeto por apenas um breve espaço de tempo; na depressão há lentidão e dificuldade de concentrar a atenção e nas neuroses habitualmente, há exaustão da atenção e distraibilidade.

Mesmo sob tratamento medicamentoso o indivíduo com transtorno mental sofre alterações nas habilidades para conduzir veículos , pois os medicamentos muitas vezes, apresentam efeitos colaterais perigosos para o ato de dirigir, como por exemplo: sonolência, dificuldades de concentração, longos tempos de reação, irritabilidade , ansiedade, perturbações esporádicas da memória. Por está razão é de extrema importância que o paciente com transtorno mental e as pessoas responsáveis por este paciente busque o acompanhamento de um médico qualificado a fim de observar, monitorizar de perto o surgimento dos efeitos colaterais e fazer os ajustes para que os efeitos adversos sejam instituídos logo que possível.

Na avaliação psicológica para obtenção da permissão para dirigir , existe um consenso nas opiniões de profissionais e pesquisadores da área, sobre a necessidade de se investigar as características de personalidade do motorista acidentógeno, através de instrumentos psicológicos padronizados ( testes ) , procurando detectar os transtornos e sua propensão a acidentes.Quanto mais informação se tem sobre o motorista, como o conhecimento de traços de personalidade, mais possibilidades se terá de tomar providências para prevenir o alto índice de acidentes de trânsito.

Podemos observar uma carência de estudos e pesquisas, que aborde a questão das conseqüências que um indivíduo com transtornos mentais pode trazer para o trânsito. O artigo, “Transtorno de personalidade e propensão a acidentes de tráfego”, publicado pela Associação Brasileira de Acidentes e Medicina de Tráfego ( ABRAMET, 1999 ), junto com alguns exemplos de comportamento citado por BARLOW (1999), abordam e fornecem uma visão voltada para o assunto.

Vamos a eles:

. Personalidade Ansiosa ( Esquiva ) : situações agorafóbicas típicas incluem viajar de carro. A agorafobia leve é exemplificada pela pessoa que hesita em dirigir sozinha por longos percursos, mas consegue dirigir, por exemplo, ao trabalho. A agorafobia moderada é demonstrada pela pessoa que dirige dentro de um raio de pouco mais de 8 quilômetros de casa, mas somente acompanhada. O indivíduo pode ter medo de ficar tão ansioso enquanto está dirigindo e, nessa ocasião, de perder o controle da direção, sair da estrada e morrer, pois os sintomas de inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele, a dificuldade em concentrar-se ou sensações de “branco” na mente, irritabilidade, podem afetar o ato de dirigir , levando-o a propensão de acidentes.

. Transtorno de Personalidade Obsessivo-compulsivo: pode ser o que provoca menor comprometimento, já que o perfeccionismo, atenção a detalhes e perseverança, podem ser traços bastante desejáveis, principalmente na esfera profissional; mas no trânsito estas pessoas são as vítimas naturais dos causadores de acidentes. Escrupulosas e cautelosas, seguem a lei rigorosamente, prejudicando e atrapalhando os apressados, “furadores de fila”, velocistas e imprudentes de modo geral. Podem estar à frente de engavetamentos e em meio a colisões em semáforos ( já pára no amarelo... ), neblinas e em situações de fluxo alto e rápido, grandes marginais, por exemplo. Muitos obsessivo-compulsivos tem medo de que algo terrível aconteça, se eles não conseguirem executar seus rituais. Alguns temem em matar alguém enquanto dirigem, levando-o muitas vezes a frear repentinamente enquanto dirigem, por medo de ter atropelado um pedestre.

. Personalidade Dissocial: anti-sociais e egoístas, não hesitam em tirar ou levar vantagens sobre quem quer que seja. Interessados em alguém ou alguma coisa, não medem as conseqüências para obter o que lhes interessam. Em “ação”, não respeitam sinalização, locais de estacionamento, semáforos, conversões proibidas, pedestres. O acidente típico é a fuga desastrada quando perseguidos.

. Transtorno da Personalidade com Instabilidade Emocional: tendem a ser impulsivos, violentos e imprevisíveis, dirigem conforme o momento emocional. Distraídos, calculam mal as distâncias e obstáculos; abusam dos veículos e pedestres. São pessoas perigosas no trânsito, porque súbita e abruptamente, fazem manobras arriscadas em velocidade impróprias e provocam pequenas e grandes colisões. Abusam, muitas vezes, de substâncias, sob a influência de álcool ou drogas conduzem de forma imprudentes , adotando muitas vezes um comportamento auto-destrutivo.

. Personalidade Histriônica: apresentam baixos limiares de tolerância à tensão e à frustração. Sob pressão excessiva ( como no trânsito ) perdem o autocontrole, a coordenação motora e a orientação tempo-espacial. Como freqüentemente expressão a emoção com exageros inadequados, podem expressar sua raiva como fúria intensa, levando a situações de riscos, como aquelas em que o motorista, acompanhante, passageiro ou pedestre brigam entre si, dentro e fora dos veículos.


PRESA ( 2002 ) diz que não podemos aconselhar que todos os motoristas devam fazer psicoterapia, porém devemos alertar que a saúde mental do motorista deve ser cuidada no sentido de auto-conhecimento acerca de seus sentimentos de irritação, raiva, fúria, etc., diminuindo assim os elevados números de mortos e feridos no trânsito.

A formação de pesquisadores nas universidades é um dos caminhos mais rápido para a evolução e geração de conhecimento e prevenção dessa epidemia de acidentes no trânsito ; quando detectados estes indivíduos, antes da autorização para dirigir ou depois , deveriam ser encaminhados para uma orientação, para algum atendimento ( grupos de reeducação, acompanhamentos psicológicos ou outras alternativas criadas pelo órgão responsável em parceria com Universidades ). Isto, seria de grande importância para diminuição dos problemas de violência no trânsito.

· Psicóloga Perita em Trânsito – PUC/PR

Cassemira Maia Kopycki